Revista Mercado e Negócios Advogados - n 44 - Março/2013
Há muito tempo, empresas industriais adotam um conjunto de práticas que denominam de “gestão de operações”. Resumidamente, pode-se dizer que a gestão de operações se ocupa de garantir que os produtos ou serviços de determinada empresa sejam produzidos e disponibilizados ao mercado da maneira mais eficiente possível.
Atualmente, a “maneira mais eficiente possível” compreende não só aspectos relacionados ao custo de produção ou distribuição, à sua velocidade, à qualidade dos produtos ou serviços, mas também ao seu alinhamento com a estratégia da empresa.
Obviamente, a produção eficiente e alinhada à estratégia não beneficia somente empresas industriais. Prestadores de serviços e, entre eles, escritórios de advocacia, podem se beneficiar enormemente dessas ferramentas.
Ocorre, contudo, que empresas industriais contam com profissionais com formação especializada em gestão de operações – disciplina estudada nos cursos de administração e, eventualmente, em faculdades de engenharia –; o arcabouço teórico é muito mais rico e profundamente pesquisado; as métricas são muito mais tangíveis (bens produzidos por dia, estoque de segurança, nível de defeitos etc.); os recursos tecnológicos mais amplos; e os investimentos muito maiores.
A realidade, como se sabe, é diferente em escritórios de advocacia. Em regra, quem gerencia as operações são advogados (cuja formação não incluiu gestão de operações), que aprenderam a gerir seus trabalhos com aqueles que os sucederam e não, necessariamente, valendo-se das melhores práticas e recursos disponíveis. Existe certo ceticismo (ou talvez conservadorismo) em relação à adoção de novos procedimentos ou novas tecnologias e os recursos destinados a essa área, embora tenham aumentado, ainda são escassos.
Todavia, a gestão adequada das operações de um escritório de advocacia pode conduzir, como já faz em empresas de outros segmentos, a:
(i) redução de custos;
(ii) aumento da qualidade;
(iii) diminuição de retrabalho;
(iv) aumento da satisfação de clientes; e
(v) diminuição dos riscos associados à atividade.
Existe ainda um efeito indireto, difícil de ser mensurado, mas fácil de ser inferido, o aumento da satisfação dos clientes pode gerar indicações de novos clientes, assim como a redução de custos pode propiciar a formação de preços mais competitivos, aumentando as possibilidades de novas contratações, de modo que, indiretamente, a gestão de operações também fortalece a estratégia de marketing e pode inclusive contribuir para o aumento do faturamento.
O cenário jurídico dos últimos anos tem apresentado um acirramento da concorrência entre os escritórios nacionais, a ameaça de novos competidores estrangeiros e, como se nada disso bastasse, uma constante pressão por redução de custos por parte dos clientes.
Nesse cenário turbulento, poucos fatores estão sob o controle de um escritório. A demora do judiciário não está, os preços e a qualidade da concorrência não estão, as exigências dos clientes certamente também não, o nível de formação dos novos advogados ou estagiários não está, mas a gestão de operações está totalmente sob controle e pode fornecer relevantes diferenciais competitivos.
Alguns exemplos talvez ajudem a esclarecer o escopo da gestão de operações.
Imagine um escritório que atue com contencioso de alto volume, com processos espelhados pelo Brasil inteiro e que se valha, frequentemente, de correspondentes. O procedimento para seleção, contratação, verificação dos trabalhos, autorização de pagamentos e eventuais cobranças de reembolsos é relativamente complexo, não raro, distribuído entre diversas áreas e pessoas e distribuído ao longo do tempo.
A experiência tem demonstrado que esse procedimento está sujeito a falhas em praticamente todos os passos, ocasionando demoras na execução final do serviço, custos elevados e até mesmo perda de oportunidades de reembolso.
A gestão de operações visa fortalecer o processo, identificar os pontos possíveis de falha e os possíveis ganhos em produtividade e em custos. Por exemplo, a centralização de trabalhos em determinada região em apenas um correspondente pode fortalecer o relacionamento comercial e propiciar descontos significativos. Do mesmo modo, um relacionamento mais constante permite que o correspondente se vincule a regras e procedimentos de maneira mais eficiente e pode aumentar sua disponibilidade ao escritório que o contrata constantemente.
Certamente o conhecimento, pelo correspondente, do processo que acompanha facilitará o seu trabalho e o tornará mais efetivo.
Por outro lado, a estipulação clara de procedimentos internos, formulários ou rotinas bem definidas e de responsáveis por cada etapa tende a evitar erros na cobrança, falhas nos documentos solicitados ou na conferência dos recebidos.
E mais, talvez o volume de processos em determinado lugar seja tão relevante que simplesmente valha a pena montar uma filial própria e trabalhar na contratação de um advogado local ou mesmo na busca por um novo sócio.
A gestão de operações nesse caso deve se preocupar em estabelecer regras, procedimentos e responsáveis. A partir de que distância a contratação de um correspondente passa a ser economicamente viável? Quantos processos determinado correspondente suporta? Ele está suficientemente estruturado para atender as demandas a tempo? Qual o preço aceitável? Que procedimentos ele deverá seguir?
Mas não só no contencioso de volume a gestão de operações pode trazer resultados positivos, também em atividades supostamente de maior “valor agregado” a adoção de ferramentas de gestão de operações se mostra vantajosa.
Considere um escritório voltado à realização de operações de fusões e aquisições, que realize algumas operações ao longo do ano, cada qual resultando em alguns contratos de dezenas, se não centenas de páginas, por vezes bi-colunados. Você imagina que esse escritório, a cada operação, elabore cada contrato desde o início? Do zero? Partindo de uma folha em branco? Não!!!
A estrutura do contrato é tomada de empréstimo de outras transações, algumas cláusulas são copiadas, enxertadas e modificadas. Os advogados mais experientes se recordam das referências que reputam serem as melhores e transmitem as informações e instruções aos mais jovens.
Entretanto, na maior parte das vezes, esse conhecimento é passado de forma empírica, a cada novo caso, a cada nova transação e a consequência desse procedimento é a relativa demora de um novo membro em absorver aquele conhecimento previamente acumulado pela instituição, sem falar no risco de que o “modelo” tomado como paradigma não seja exatamente o mais recente, o mais atual, o mais completo ou mesmo de, por lapso, serem esquecidas no novo contrato referências indevidas ao antigo caso (como nomes, valores ou condições envolvidas)
Pode, contudo, ser diferente. O escritório pode elaborar um roteiro dos pontos a serem analisados em cada contrato, implementar modelos de melhores cláusulas, ora para vendedores, ora para compradores, pode manter estruturas padrão de contrato com um número maior ou menor de declarações e garantias, com preços fixos, com preços variáveis, com ou sem “earn-out”, para um determinado setor específico, com ou sem submissão ao CADE e assim por diante.
Diversos escritórios americanos, por exemplo, trabalham com softwares destinados ao que se convencionou chamar de “document assembly”, ou seja, automação na elaboração de documentos que partem de trechos ou estruturas padrão.
Qual o trabalho da gestão de operações nesse caso? Identificar aquilo que pode ser automatizado, identificar os melhores paradigmas, escolher a ferramenta correta (seja um minutário, seja um software de automação), acompanhar sua implementação e utilização.
O escritório reduz custos e pode praticar preços mais competitivos, os clientes percebem uma relação custo benefício melhor, a qualidade do serviço é favorecida por partir de melhores práticas e o treinamento de novos colaboradores é facilitado.
Um velho ditado popular diz que “uma corrente é tão forte quanto seu elo mais fraco”. E qual o elo mais fraco em escritório de advocacia? Provavelmente os estagiários, pois são mais jovens, menos experientes, menos comprometidos com os clientes. Mesmo assim, em muitos escritórios alguns escritórios delegam aos estagiários o acompanhamento de publicações a imputação de informações nos sistemas de gerenciamento de processos, a atualização de relatórios de contingências e é absolutamente natural que o façam.
Todavia, se os estagiários são realmente o elo mais fraco podem cometer erros na execução desses procedimentos, de modo que para garantir a segurança nessas tarefas é recomendável que boa parte seja automatizada e que as tarefas tidas como críticas contem não só com supervisão, mas também com revisão.
Imagine quanto tempo um escritório não perde imputando dados sobre o andamento dos processos no seu sistema de gestão para posteriormente imputar informações bastante semelhantes em um relatório em Word Ou Excel, pelo simples fato de que o formato do relatório exigido pelo cliente é diverso daquele extraído do sistema.
Calcule os riscos associados a essa atividade, as possibilidades das informações se perderem, serem distorcidas ou simplesmente desatualizadas.
Mais uma vez é a gestão de operações que entra em cena, revisando os procedimentos, elegendo responsáveis, controlando os processos.
Pense nisso, nada está tão bom que não possa ser melhorado.
Simone Paris Akamine